quarta-feira, 25 de junho de 2008

Dona Ruth: cordialidade, inteligência e bom-humor

Marcelo Tas*

Estive pela primeira vez com dona Ruth quando Marta ainda era sexóloga, no ano desta foto de Jorge Araújo: 1985.

O marido dela tentava ser prefeito de São Paulo, quando foi derrotado por Jânio Quadros, já velhinho, com caduquice galopante, o que em se tratando de Jânio era quase o estado mental, digamos, normal.

Ao contrário de Marta, Ruth nunca se importou, sentiu-se insegura ou precisou espernear contra ser chamada de "Dona Ruth". Formato antigo de se referir às mulheres que se ocupavam resignadas dos afazeres domésticos, o que não era evidentemente o caso dela. Pelo contrário, Ruth Cardoso tinha vida própria, profissional e intelectual. E, como quase toda mulher de político, pairava léguas acima das ansiedades e turbulências do maridão no poder.

Na manhã da fatídica derrota para Jânio, me recebeu em sua casa num link ao vivo para a TV Record, na mesa do café-da-manhã de seu apartamento em Higienópolis. Como a absurda lei eleitoral- a que impede entrevistas com candidatos- começava a vigorar naquele pleito, respondeu minhas perguntas pontiagudas, ao lado do marido calado, com cordialidade, inteligência e bom-humor.

Com seu súbito e lamentável desaparecimento, perdemos a chance de acesso à uma versão dela desta recente e nebulosa História do Brasil. Seria um livro indispensável. Será que ele existe guardado em alguma das gavetas no apartamento da Rua Rio de Janeiro?

Que ela inspire Marta e todos nós a pairar, mesmo que alguns centímetros, acima da mediocridade persistente da política nacional.

Obrigado e vá em paz, Dona Ruth.

*Colunista e apresentador do Programa CQC, da rede bandeirantes.

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