João Domingos
Agência Estado - DF
Começa a ser definida hoje, numa reunião entre representantes dos governos do Brasil e da Bolívia, em Cobija, na fronteira com o Acre, a solução para cerca de 350 a 400 famílias de brasileiros ilegais que vivem da extração de castanha e borracha e de pequenas lavouras dentro da faixa fronteiriça de 50 quilômetros, na província boliviana do Pando. O governo está cumprindo uma determinação constitucional, mas adotando uma estratégica polêmica. É que, para o lugar dos brasileiros, Evo Morales está enviando seus correligionários políticos, numa atitude combatida por seus opositores, que o acusam de mandar eleitores para províncias onde o governo central não tem apoio, como a do Pando.
Desde 2006, quando foram intimadas pelo governo da Bolívia a deixar as posses que ocupam, as famílias de brasileiros passam por momentos de tensão. De acordo com o Itamaraty, elas têm sido submetidas a chantagens e achaques por parte de pessoas que se apresentam como se fossem autoridades bolivianas ou brasileiras. Por causa das ameaças, algumas famílias até venderam as posses por preço vil.
Nessa confusão, o Brasil contratou por U$ 10 milhões a Organização Internacional para Migrações (OIM), entidade com experiência em migrações, principalmente na África e no Leste Europeu. Ela ficou encarregada de fazer desde os levantamentos sobre as famílias, quantas são, do que vivem, o que fazem, até o processo final de reassentamento. Serão estes dados que a OIM vai apresentar hoje às delegações do Brasil e da Bolívia, em Cobija, capital do Pando.
CONSTITUIÇÃO
A expulsão dos brasileiros da faixa de fronteira ocorre por determinação do artigo 25 da Constituição da Bolívia - desde a antiga Carta é proibida a permanência de não-bolivianos em toda a área fronteiriça de 50 quilômetros. Mas não era um artigo implementado. Com a chegada de Evo Morales ao poder, ele resolveu que a norma constitucional deveria ser cumprida.
Como o prazo final para a saída das famílias termina em outubro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva conseguiu de seu colega boliviano, durante encontro no mês passado, que a retirada dos brasileiros só ocorresse depois do trabalho da OIM. Enquanto isso, colonos da região do Altiplano, onde Evo é forte politicamente, aguardam a desocupação das posses dos brasileiros para, a seguir, instalarem-se ali.
No acordo feito com Evo, os brasileiros poderão ser reassentados em áreas do interior da Bolívia longe da fronteira ou, se quiserem, podem retornar ao Brasil e se candidatar a projetos de reforma agrária brasileiros no Acre. Também podem se naturalizar bolivianos - o que permitiria que ficassem na fronteira -, mas esse é um conselho que a política externa do Brasil não dá. "Achamos que os brasileiros devem continuar a ser brasileiros", disse o embaixador Eduardo Gradilone Neto, diretor do Departamento das Comunidades de Brasileiros no Exterior, do Itamaraty. Ele estará no comando da equipe que receberá os dados da OIM.
CONSULADO
Gradilone disse que, no processo de tentar chegar a uma solução para os brasileiros que ocupam a faixa fronteiriça da Bolívia, será instalado mais um consulado no país vizinho, na comunidade chamada Puerto Evo Morales, próxima a Assis Brasil, no Acre. Puerto Evo Morales é um longínquo lugarejo formado por palafitas e é nele que os brasileiros que vivem do lado boliviano costumam comprar bens básicos, como sal e açúcar.
O governo do Pando chegou a fazer um projeto de agrovila para os brasileiros, perto de Cobija, na área de 50 quilômetros de fronteira. Mas, como a proposta de abrir a exceção era das oposições, não foi adiante. Ao contrário, ajudou a agravar a crise entre o governo da província e o central. Houve violência e o governador do Pando, Leopoldo Fernández, foi preso - hoje, da cadeia, é o candidato a vice-presidente na chapa da oposição para a próxima eleição.
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