domingo, 7 de dezembro de 2008

Correio Braziliense denuncia assistencialismo de Tião Viana no Acre

Chico Araújo, da Agência Amazônia

Com uma chamada de primeira página, que leva o título “De carona na velha política do bem social”, o Correio Braziliense dedica duas páginas — as de número 2 e 3 — da sua edição de hoje, 7, ao senador Tião Viana (PT-AC). Ilustrada com várias fotos, a reportagem é assinada pelo jornalista Lúcio Vaz. Diz que Tião Viana, favorito de Lula para a presidência do Senado Federal, apresentou emenda para financiar a distribuição de 1,8 mil cadeiras de rodas, muletas e bengalas a pessoas com deficiência física no Acre.

Segundo o jornal, o senador esteve em 20 dos 22 municípios, em período pré-eleitoral, para participar da solenidade de entrega. Em Epitaciolândia, a distribuição chegou a ser suspensa por quatro horas pela Justiça Eleitoral. A matéria diz ainda que a suspensão da entrega de cadeiras ocorreu por suspeita de uso político.

O site oficial do senador faz propaganda ostensiva acerca da distribuição das cadeiras. Num texto batizado de Mais uma ação do programa de atendimento a deficientes, o senador gaba-se de ser o autor da emenda de uma emenda de R$ 3 milhões que garantiu a compra das cadeiras. Além dos elogios do secretário de Saúde, Osvaldo Leal, o texto uma fala de Viana, na qual ele afirma: “ [...] em 500 anos da República no Brasil, não se ouviu falar de uma programa dessa magnitude. ” O texto traza ainda eleogios de prefeitos e vereadores do PT a Viana pelo fato de o mesmo ter apresentado a emenda para a compra das cadeiras de rodas.

POLÍTICA
O jeito Tião de fazer política

Por Lúcio Vaz, do Correio Braziliense

Favorito de Lula para o cargo de presidente do Senado, parlamentar acreano distribuiu cadeiras de rodas, muletas e bengalas durante o período pré-eleitoral.

Candidato a presidente do Senado, Tião Viana (PT-AC) mostrou este ano no Acre um estilo próprio de fazer política. Uma emenda individual de sua autoria financiou a distribuição de 1,8 mil cadeiras de rodas, muletas e bengalas para portadores de deficiência física. A entrega começou no período pré-eleitoral, em março, e estendeu-se até o início da campanha para as eleições municipais, em julho. Tião participou da distribuição em 20 dos 22 municípios do estado. No último 13 de junho, em Epitaciolândia, a solenidade foi suspensa pela Polícia Federal, a pedido da Justiça Eleitoral. Após quatro horas, o juiz Leandro Gross determinou o prosseguimento do evento.

Tião afirma que participava da entrega dos equipamentos a convite do secretário estadual de Saúde, Osvaldo Leal. “O secretário de saúde me chamava. Aí, eu ia junto fazer a entrega”. A distribuição teve sempre larga divulgação dos veículos de comunicação do estado, com declarações dos beneficiados, do senador e de autoridades locais e estaduais.

A emenda individual, no valor de R$ 3 milhões, foi apresentada em 2005 para Orçamento União de 2006. Os recursos foram reservados no Orçamento naquele ano, mas o dinheiro não foi liberado. Ficou “empenhado” para ser executado nos anos seguintes. Os pagamentos ocorreram de março a julho de 2007, mas a entrega dos equipamentos começou somente no fim de março deste ano, cerca de nove meses mais tarde. A distribuição foi concluída em 27 de julho, nos municípios de Tarauacá, Jordão e Feijó. Nessas cidades, os prefeitos candidatos não participaram da solenidade.

“Uso político”

A solenidade em Epitaciolândia começou por volta das 8h, no Centro Cultural, com a presença do prefeito José Ronaldo (PSB), da prefeita de Brasiléia, Leila Galvão (PT), do senador Tião Viana e de outras autoridades locais. Foram distribuídas 135 cadeiras de rodas, sendo quatro motorizadas. Após a entrega dos equipamentos, o senador já estava no caminho de volta para Rio Branco quando foi informado de que a Polícia Federal havia chegado ao local. Ele retornou imediatamente e foi abordado pelo delegado Augusto Rézio.

“É que chegou uma denúncia de que estaria havendo uso político disso. Nós estamos cumprindo uma ordem do juiz e viemos procurar esclarecimentos”, informou o delegado. “Delegado, eu não estou entendendo. Isso é uma coisa de 2005, 2006, um programa federal, que está em absoluta conformidade com a legislação eleitoral. Não pode haver descontinuidade de nenhum programa mesmo em ano eleitoral”, justificou o senador. Ele foi até o juiz, que leu a resolução do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que regulamentou as eleições de 2008.

Segundo relato do senador, Gross teria identificado um item que permitia a entrega dos equipamentos. “Ele leu e viu que tem um item que diz que não pode haver interrupção quando é programa do governo federal”. O juiz pediu ao senador enviasse documentos que comprovassem a origem dos recursos e sua execução financeira já no ano anterior. Durante quatro horas, os portadores de deficiências foram retidos no Centro Cultural. Com a chegada de documentos enviados pela Secretaria Estadual de Saúde, todos foram liberados com as cadeiras de rodas.

Sobrou para o juiz

O juiz eleitoral Leandro Gross solicitou a fiscalização da Polícia Federal em Epitaciolândia (AC) porque recebeu informações de que a entrega das cadeiras de rodas estaria infringindo o artigo 42 da Resolução 22.718/2008 do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Esse capítulo aponta as condutas vedadas aos agente agentes públicos em campanha eleitoral, porque afetam a igualdade de oportunidades entre os candidatos.

O inciso IV proíbe “fazer ou permitir o uso promocional em favor de candidato, partido ou coligação, de distribuição gratuita de bens e serviços de caráter social custeadas ou subvencionadas pelo poder público”.

Mas o inciso 9º abre algumas brechas na legislação. Diz que, no ano em que se realizar a eleição, fica proibida a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da administração pública. No entanto, exceção nos casos de calamidade pública, estado de emergência ou de “programas sociais autorizados em lei e já em execução no exercício anterior, casos em que o Ministério Público poderá promover o acompanhamento de sua execução financeira”. Ou seja, esse inciso diz que podem ter continuidade programas sociais já em execução no ano anterior, mas não libera o uso promocional em favor de candidato.

Mesmo com a liberação da entrega dos equipamentos, o juiz eleitoral foi processado pela Associação dos Portadores de Deficiências do Acre. O secretário estadual de Saúde, Osvaldo leal, e o senador Tião Viana apresentaram reclamação contra o juiz à Corregedoria do Tribunal Superior Eleitoral.

Petista diz que teve poliomielite

O senador Tião Viana (PT-AC), vice-presidente do Senado, afirmou que a suspensão da entrega de cadeiras de rodas em Epitaciolândia “foi um ato de pura desinformação do juiz com a lei e que causou um enorme constrangimento.” Ele confirma que fez uma reclamação formal da atitude do juiz Leandro Gross. “Quando cheguei em Rio Branco, soube que até o meio-dia os deficientes ainda estavam retidos, numa situação muito constrangedora. Houve uma reclamação minha e do secretário de Saúde para o corregedor do TSE, mas só porque os deficientes ficaram muito tempo constrangidos”.

Tião afirma que seu envolvimento com os portadores de deficiência vem de longa data: “Eu tive poliomielite com um ano de idade. Na minha rua foram sete casos. Todos ficaram em cadeiras de rodas, eu não. Com terapia, evolui. É uma coisa que sempre foi muito ligada a mim emocionalmente. Em 2005, apresentei uma emenda ao Orçamento para atender todos os deficientes do Acre, que eram dependentes de cadeiras de rodas, bengala, muleta, essas coisas. Foi incluído naquele programa de pessoas portadoras de deficiência do Ministério da Saúde”.


O senador conta que a emenda foi aprovada, mas houve demora no processo de licitação e compra dos equipamentos. “O governo licitava e não apareciam empresas para atender. Eu, mesmo candidato em 2006, não quis apressar nada. Saiu agora em 2008. Ao sair, iniciou o processo de entrega de cadeiras nos 22 municípios. Como ajudei a criara a Associação dos Portadores de Deficiência, sempre participo desse movimento. Aí, eu ia junto com o secretário fazer a entrega”.


O início da distribuição aconteceu somente no fim de março. Tião justificou o atraso da entrega do material: “O problema é que as fábricas não entregavam. Não é um ato que está se criando agora. É a continuidade da execução de um programa”.

Ele afirma que não houve favorecimento político na distribuição dos equipamentos: “Epitaciolândia é um município de um perfeito de oposição. O José Ronaldo (PSB) estava disputando com um candidato do PT”. Já no período eleitoral houve entrega de cadeiras de rodas em Feijó, Jordão e Tarauacá. Nesses municípios, os candidatos a prefeito não participaram da solenidade. O Acre é o único estado em que todos os deficientes receberam cadeiras de rodas, bengalas e muletas (LV).

Ação por suspeita de uso eleitoral

O secretário estadual de Saúde do Acre, Osvaldo leal, tentou explicar porque a entrega das cadeiras de rodas só teve início no período pré-eleitoral, quando o dinheiro do Fundo Nacional de Saúde foi depositado em quatro parcelas, entre março e julho de 2007. “O dinheiro foi depositado no início do segundo semestre do ano passado. Fizemos a licitação de outubro a novembro. E recebemos os equipamentos de janeiro a fevereiro deste ano. Só podemos iniciar o processo de licitação quando o governo libera a primeira parcela”.

Leal afirmou que o material adquirido foi bastante completo: 1,5 mil cadeiras de rodas normais e 300 especiais — de banho, adaptadas para crianças —, incluindo nesse grupo 50 motorizadas. Também foram adquiridos equipamentos para a montagem de cinco unidades de fisioterapia. Ele informou que a entrega foi suspensa em julho, mas será retomada após uma avaliação de novos pedidos encaminhados pela população.

O delegado Gustavo Rézio afirmou ao Correio que interrompeu a solenidade a pedido do juiz eleitoral, porque havia suspeita de uso eleitoral da distribuição de cadeiras de rodas. E acrescentou que tudo foi esclarecido no encontro com o senador Tião Viana com o juiz Leandro Gross. O juiz não quis dar declarações sobre o episódio, mas a sua decisão, registrada no cartório eleitoral de Brasiléia, diz que “uma vez comprovada possibilidade jurídica do evento, verifico que não há óbice para o seu prosseguimento. Sendo assim, determino que a decisão seja comunicada imediatamente ao delegado da Polícia Federal, visando o prosseguimento do evento”.

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