segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Correio diz que Jorge e Tião Viana são os novos coronéis do Acre

Em extensa reportagem, jornal afirma que os irmãos Viana praticam política assistencialista de adversários que combateram.

Agência Amazônia

Novamente, em duas páginas — as de números 2 e 3 — o Correio Braziliense coloca a nu a forma dos irmãos Jorge e Tião Viana, ambos do PT, fazerem política no Acre. A primeira página diz: “Tião e João são os novos coronéis do Acre”. Segundo o texto, o governador (ex, na verdade) Jorge Viana e o senador Tião Viana construíram a carreira política atacando o assistencialismo praticado pelos antigos adversários. Dez anos depois, os dois petistas elogiam os velhos caciques e Tião faz uso eleitoral da distribuição de benefícios sociais à população.

O Correio havia revelado, ontem, o estilo de Tião Viana fazer política. Revelou que o senador apresentou uma emenda individual de R$ 3 milhões para financiar a compra de 1,8 mil cadeiras de rodas, muletas e bengalas para pessoas com deficiência em 20 dos 22 municípios do Acre. O senador participou da entrega dos equipamentos no período pré-eleitoral e já início da campanha para as eleições municipais, em julho. Em Epitaciolândia, a solenidade foi suspensa por quatro horas pela Polícia Federal, a pedido da Justiça Eleitoral. Mas as cadeiras foram entregues.

Ainda de acordo com o Correio, o episódio de distribuição de cadeiras de rodas em município do Acre enfraquece apoio a Tião Viana na corrida pela Presidência do Senado. A revelação do caso, segundo o jornal, afastou o DEM e o PSDB da candidatura de Viana.

CONGRESSO

Há 10 anos, os irmãos Tião e Jorge Viana combateram o assistencialismo dos velhos caciques do Acre. Hoje, elogiam antigos adversários. E o senador passou a usar métodos eleitorais parecidos.

Os novos coronéis
LÚCIO VAZ
DA EQUIPE DO CORREIO

A distribuição de benefícios sociais à população em atos políticos, feita pelo senador Tião Viana (PT-AC) e revelada pelo Correio na edição de ontem, é uma prática antiga no Acre. Em março de 1998, o então governador Orleir Cameli (PFL) entregava cestas básicas, máquinas de costura e motores de popa em praça pública durante a pré-campanha pela reeleição. Pressionado por representação do Ministério Público, Cameli desistiu da reeleição. O adversário Jorge Viana (PT) foi eleito governador. Hoje, os Viana dominam a política do Acre, com a adesão dos antigos adversários, que são elogiados nos palanques. Entre eles, Cameli.

Na pré-campanha para o governo, em 1998, Jorge Viana temia pela própria vida, mas fazia duros ataques ao então governador. “Nós não temos um governo, temos um desmonte. É o fantasma do descaso, da humilhação, do cartel. São grupelhos de pessoas que se organizaram e atuam como bandos. Tudo isso coordenado por um governador que não tem um currículo, mas uma folha corrida. Só não vou ser candidato se me matarem”, afirmou Jorge, em abril daquele ano.

No ano passado, no lançamento da pavimentação da estrada entre Feijó e Sena Madureira, na BR-364, ao lado de Cameli, Jorge Viana saudou o novo aliado: “Durante décadas, muitos políticos usaram a estrada como palanque, mas o Orleir foi o primeiro a sair dele e a dar início à pavimentação da BR-364”. Tião Viana completou: “Quero dizer da minha alegria de estar ao lado do ex-governador Orleir Cameli e do seu irmão Eládio, nesse momento de desafio. Um desafio que é do tamanho da nossa história”.

Jorge Viana nega que exista hoje uma aliança com Cameli. “O governo não tem nenhuma aliança. O que tem é que ele se manifestou favorável a um candidato do PR, que nós apoiamos em Cruzeiro do Sul. E tem um sobrinho dele que é deputado federal pelo PR, e o PR está na aliança do governo federal e do Acre.” O ex-governador petista diz que houve uma adesão: “Houve um processo de pacificação. A aliança se ampliou, mas não a partir de concessões. O que houve é adesão a um projeto que está dando certo”.

O adversário mais radical do governo Jorge Viana, o ex-deputado federal Narciso Mendes, diz ter abandonado a política. “A gente cansa. No Acre, não tem mais eleição. Aqui tem compra de voto. Aqui, uma eleição é feita na base de mercado eleitoral. Eu fui a única pessoa que teve a coragem de enfrentar o governo de Jorge Viana. O resto era um bando de calça frouxa, como continua sendo. Daqui a dois anos, a eleição do Tião Viana não é eleição, é uma nomeação.”

Narciso poupa o governador Binho Marques (PT). “Quando vêm trazer denúncia contra o governo, eu digo que deixei de ser delegacia de polícia. Agora, o que eu posso dizer é que ele é um cidadão absolutamente decente.” O jornal de Narciso, O Rio Branco, agora divulga os releases produzidos pelo governo petista. Questionado se o seu jornal e a sua televisão têm recebido publicidades do governo, responde: “Eu não sou hipócrita. Aqui duas coisas têm que ser respeitadas. Primeiro, a notícia. Depois, isso é uma empresa. No final do mês, ninguém quer saber se o jornal foi democrático. Eu não tenho relacionamento com esse povo. Agora, sou obrigado a dizer que o governo é decente”.

Jorge Viana afirma que Narciso não tem nenhuma relação com o governador ou com qualquer dirigente do PT. “O que acontece é que o senhor Narciso, contra quem eu tenho mais de 50 processo na Justiça, resolveu mudar de posição e dizer que não é mais um militante político do partido dele. Mas não é aliado nosso nem será, porque nem ele quer nem a gente quer”, diz. “O Acre mudou, mas as situações emblemáticas permanecem as mesmas. Eu vou pagar pelo resto da vida por ter tomado algumas atitudes naquela época, porque algumas pessoas estão presas, outras estão com muita raiva de mim.”

Em março de 1998, Orleir Cameli foi flagrado entregando os produtos dos programas O Pão Nosso e Novo Horizonte em Sena Madureira, distante 150km de Rio Branco. O primeiro programa foi criado no ano eleitoral. O então governador pretendia entregar 5 milhões de quilos de alimentos de março a dezembro. Seriam 30 mil cestas básicas por mês. A distribuição seria controlada por uma cartela. Em Sena Madureira seriam 1,2 mil sacolões. Em Rio Branco, mais 15 mil. O Novo Horizonte previa a entrega de 2 mil máquinas de costura, mil máquinas de farinha, 2,2 mil motores de popa, beneficiadoras de arroz e kits para agricultores. Com base na representação feita pelo procurador eleitoral do Acre, Ricardo Nakahira, o Tribunal Regional Eleitoral suspendeu os programas em 21 de abril daquele ano.

O Correio tentou contato por telefone e por e-mail com o governador Binho Marques, mas não houve resposta. A assessoria de imprensa do senador Tião Viana afirmou que ele estava no interior do estado, sem contato por telefone.

Mudança de discurso

“Nós não temos governo, temos um desmonte. São grupelhos que se organizaram e atuam como bandos (...) coordenados por um governador (Cameli) que não tem um currículo, mas uma folha corrida”

Jorge Viana, em abril de 1998

“Quero dizer da minha alegria de estar ao lado do ex-governador Orleir Cameli e do seu irmão Eládio, nesse momento de desafio. Um desafio que é do tamanho, talvez, da nossa história”

Tião Viana, em dezembro de 2007

Entenda o caso

Tião explicou por que participava das solenidades de entrega dos equipamentos: “O secretário de Saúde me chamava. Aí, eu ia junto fazer a entrega”. A emenda individual, no valor de R$ 3 milhões, foi apresentada para o Orçamento da União de 2006, mas o dinheiro não foi liberado naquele ano. Os pagamentos ocorreram de março a julho de 2007. A entrega dos equipamentos começou somente no fim de março deste ano, sendo concluída em 27 de julho, nos municípios de Tarauacá, Jordão e Feijó, sem a presença dos candidatos a prefeito locais.

Em Epitaciolândia, a solenidade teve a presença do prefeito José Ronaldo (PSB), da prefeita de Brasiléia, Leila Galvão (PT), do senador Tião Viana e outras autoridades locais. Foram distribuídas 135 cadeiras de rodas, sendo quatro motorizadas. Após a entrega dos equipamentos, por volta das 8h30, o senador já se retornava para Rio Branco quando foi informado de que a PF havia chegado ao local.

Ele retornou e foi abordado pelo delegado federal Augusto Rézio. Foi informado de que havia chegado à Justiça Eleitoral uma denúncia de que estaria havendo uso político da entrega dos equipamentos. Tião foi até o juiz eleitoral, Leandro Gross, e argumentou o programa já tinha execução orçamentária no ano anterior. Por isso, estaria de acordo com a legislação eleitoral.

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